terça-feira, 12 de junho de 2012

Resenha – Bazar Pulp, de Cesar Alcázar.


Bazar Pulp é uma coletânea de Cesar Alcázar que reúne 7 contos de Literatura Fantástica. Como é advertido na capa, todas as histórias trazem, em maior ou menor grau, aventura, fantasia e horror.
A dinâmica capa é uma ilustração de Fred Macêdo com a colorização de Robson Albuquerque. Capas com cara de comics já são uma marca registrada da Editora Argonautas, que apesar dos poucos livros lançados, já firma uma personalidade e estilo, sempre em formatinho, uma homenagem aos pulps fictions da primeira metade do século 20.
Em Bazar Pulp, especificamente, vale notar o logo do título, propositalmente planejado para dar a ideia de má impressão por erro de fotolito, muito comum nas antigas impressões mecânicas.

Meu Achismo:

O CORAÇÃO DE CÃO NEGRO

Neste conto de abertura, o cativante personagem Anrath – O Cão Negro de Clontarf – está de volta. O destino deste homem fez com que ele fosse tudo de ruim mas, ironicamente, o mercenário criado por Vikings é dotado de sentimentos, o que faz dele um personagem antagônico, tipo os personagens orientais que tanto amo *-* Quando o autor se atenta à dualidade e aplica isso ao seu trabalho, o resultado é um personagem real e muito humano, capaz de fazer o leitor se identificar com a obra – afinal, todos nós, seres ainda imperfeitos, somos dualistas, antagônicos, de personalidade ainda esfacelada em alguns “Eus” distintos.
Nesta aventura, Anrath parece um imã para encrencas, mesmo que ele seja um mercenário bárbaro que, se tiver opção, prefere não lutar. Ele tinha como missão encontrar uma moeda celta muito antiga e levar ao seu contratante, que era um astuto mago inglês que o engana e o captura, para entregá-lo a Ild Vuur – seu antigo companheiro e quase irmão.
Um pouco do passado de Anrath é contado, incluindo um episódio de amor e companheirismo, mas tudo desfeito pela ambição luxuriosa de Ild Vuur.
Cão Negro é levado como prisioneiro para servir de oferenda num sacrifício na Ilha Orkney, mas acaba por ser salvo pela mulher de seu inimigo.
A ilha, envolta de mistérios, abriga um monstro tão antigo quanto o mundo, e trolls são os últimos guardiões de um longínquo passado, mas quando a besta é despertada pelo inglês safado, poucos são os que sobrevivem, sendo que Anrath é o único homem que resta após a carnificina.
O que me chamou a atenção neste conto é quão distante o autor foi no passado ao abordar deuses e cultos ainda mais antigos que os do povo celta.

Vou te falar algo muito a sério, César Alcázar: espero, imensamente, que você ainda escreva um livro-solo, uma série romanceada, apenas com as aventuras de Cão Negro! Um personagem tão rico merece umas boas 500 páginas de Romance!

MORDRED

Um conto tenso, crucial, sobre uma das várias versões da história de Rei Arthur.
Os nomes não são citados, mas esse Mordred é o da versão em que Arthur e Morgana são irmãos e concebem Mordred, a última esperança de Avalon, durante o Beltane.
Neste conto denso, pai e filho se combatem até a morte: Arthur defendendo a maldição católica e Mordred as tradições antigas do povo da terra.
“Nem sempre quem está do lado da razão consegue vencer. O mundo está tomando um rumo que ele mesmo escolheu.”– São as sábias palavras finais de [Morgana] para o filho que atravessava o Véu.
E o mundo escolheu a dor e o sofrimento, não é?

UMA SEPULTURA SOBRE A COLINA

Mais um conto do guerreiro mercenário Anrath.
Nesta aventura, o mercenário presenciará a Batalha de Tara, ocorrida há 40 anos na Colina de Tara, lendariamente mais grandiosa que a batalha em que ele lutou e ganhou a alcunha de “Cão Negro”.
É 31 de outubro, a primeira noite de Samhain, e durante sua viagem para se juntar ao exército de Vlaid, ele salva da morte imediata Fearghal, se ser estraçalhado e devorados pelos lobos. O velho é o último guerreiro vivo que lutou na Batalha de Tara, e queria reviver o seu momento de glória antes de morrer.
Diante de um cenário onírico, ambos guerreiros presenciam, por instantes, o espectro da grande batalha ocorrida há décadas. Mesmo depois de tanto tempo, o espírito daquela batalha continuava vivo no Outro Mundo, podendo ser vislumbrada apenas na primeira noite de Samhain.

O RELATO DO CAPITÃO BLACKBURN

Um conto diferente sobre vampiros.
Blackburn é um Homem do Mar, capitão do navio Lemora e um personagem que me passa a mesma impressão ondulante e melancólica do “Povo D’água”.
Este conto é uma missiva que Blackburn escreve ao Inspetor Constantino, relatando uma de suas expedições mercenárias em que havia embarcado uma bizarra encomenda, que deveria ser entregue e enterrada na distante terra da América do Sul.
Um conto sobre vampiros, mas sobre os bons e velhos vampiros, que causa pavor mas também piedade por tão desgraçada criatura.

A MÚSICA DO QUARTO AO LADO

Ah, esse é um conto tão bonitinho, mas com um macabro final...
Um jovem músico; Jazz; um encontro ocorrido por afinidades musicais peculiares; uma reação química perfeita e... um final inesperado!
É isso que dá ter expectativas sobre um conto romântico escrito por um homem: alguém sempre tem que morrer no final :/

O FILME

César Alcázar reuniu sua outra paixão neste conto: os filmes B. E contou a sua versão para a morte do diretor Guerrieri e o desaparecimento de seu último filme que jamais foi exibido.
O filme em questão, cujo titulo não foi revelado, produzia um fascínio obsessor àquele que o assistisse, horrorizando o Crítico que fora o primeiro a assistir à película fora do meio de produção. Havia algo diabólico que prendeu a atenção do homem, chegando a perturbar sua mente!
Há pontos muito interessantes nesse conto: o filme “sem título”; o enredo do filme que não é descrito, apenas mostrado o resultado obsedante dele; o Crítico, que também não é nomeado em nenhum momento, mas que leva o leitor a pensar que seja ele o assassino de Guerrieri e que roubou a, aparente, única cópia do filme, criando aí uma situação mítica para um caso que nunca foi solucionado.
Simples, mas bem sacado :)

A ÚLTIMA VIAGEM DO LEMORA

Último conto de Bazar Pulp, mais um conto do ambicioso Capitão Richard Blackburn, narrando por ele mesmo.
Essa história se passa durante a Primeira Guerra Mundial, em que o navio Lemora – e toda a tripulação – encontra o seu fim.
Apesar dos receios em navegar pelas águas tomadas por cruzadores e submarinos alemães, o dinheiro bem pago convenceu Blackburn em alistar o seu navio para levar suprimentos aos aliados.
Apesar do Capitão e sua tripulação terem sobrevivido ao enfrentamento de um submarino alemão, chamado por eles de U-boat, não foi isso que causou a ruína do Lemora e Blackburn. Mais uma vez a ambição do Homem do Mar dominou a sua razão e ele levou para dentro do navio um ídolo maldito esculpido em pedra, que encontrou numa sinistra ilha, que mais parecia um cemitério de navios, em que eles aportaram para consertar os danos causados pelos alemães. A bizarra figura levou Blackburn a tal fascínio que ele carregou aquela coisa, levando a desgraça para o Lemora e seus tripulantes.
A Justiça Poética do Destino Irônico fez com que Blackburn fosse o único sobrevivente daquela aterrorizante tragédia que ele próprio, com a sua ambição desmedida, provocou, obrigando-o a sobreviver com as lembranças e a culpa.

Achismo Final:
Em todos os contos, sempre paira um sentimento melancólico e desgraçado, pois, me parece, são histórias contadas por aqueles que faliram e fracassaram, o que é bem legal, pois os perdedores sobreviveram para contar suas histórias: sem falsos heroísmos, sem glórias, sem adulações.
Bazar Pulp cumpriu sua missão ;]

2 comentários:

Cesar disse...

Ao meu xará e colega da pena, parabens pelo criativo trabalho. Pat, sou fã das tuas resenhas.

Patricia Kovacs disse...

Só tu mesmo, Cesar!
Num ti dissi que tua terra tá cheia de bons escritores?
Obrigada pela preferência ^^
Bjin!

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