Bazar Pulp é uma coletânea
de Cesar Alcázar que reúne 7 contos de Literatura Fantástica. Como é advertido na capa, todas as
histórias trazem, em maior ou menor grau, aventura, fantasia e horror.
A dinâmica capa é uma ilustração
de Fred Macêdo com a colorização de Robson Albuquerque. Capas com
cara de comics já são uma marca registrada da Editora Argonautas, que
apesar dos poucos livros lançados, já firma uma personalidade e estilo, sempre
em formatinho, uma homenagem aos pulps fictions da primeira metade do
século 20.
Em Bazar Pulp,
especificamente, vale notar o logo do título, propositalmente planejado para
dar a ideia de má impressão por erro de fotolito, muito comum nas antigas
impressões mecânicas.
Meu Achismo:
O CORAÇÃO DE CÃO NEGRO
Neste conto de abertura, o
cativante personagem Anrath – O Cão Negro de Clontarf – está de volta. O
destino deste homem fez com que ele fosse tudo de ruim mas, ironicamente, o
mercenário criado por Vikings é dotado de sentimentos, o que faz dele um
personagem antagônico, tipo os personagens orientais que tanto amo *-* Quando o
autor se atenta à dualidade e aplica isso ao seu trabalho, o resultado é um
personagem real e muito humano, capaz de fazer o leitor se identificar com a
obra – afinal, todos nós, seres ainda imperfeitos, somos dualistas,
antagônicos, de personalidade ainda esfacelada em alguns “Eus” distintos.
Nesta aventura, Anrath parece um
imã para encrencas, mesmo que ele seja um mercenário bárbaro que, se tiver
opção, prefere não lutar. Ele tinha como missão encontrar uma moeda celta muito
antiga e levar ao seu contratante, que era um astuto mago inglês que o engana e
o captura, para entregá-lo a Ild Vuur – seu antigo companheiro e quase
irmão.
Um pouco do passado de Anrath é
contado, incluindo um episódio de amor e companheirismo, mas tudo desfeito pela
ambição luxuriosa de Ild Vuur.
Cão Negro é levado como
prisioneiro para servir de oferenda num sacrifício na Ilha Orkney, mas acaba
por ser salvo pela mulher de seu inimigo.
A ilha, envolta de mistérios,
abriga um monstro tão antigo quanto o mundo, e trolls são os últimos
guardiões de um longínquo passado, mas quando a besta é despertada pelo inglês
safado, poucos são os que sobrevivem, sendo que Anrath é o único homem que
resta após a carnificina.
O que me chamou a atenção neste
conto é quão distante o autor foi no passado ao abordar deuses e cultos ainda
mais antigos que os do povo celta.
Vou te falar algo muito a sério, César Alcázar: espero,
imensamente, que você ainda escreva um livro-solo, uma série romanceada, apenas
com as aventuras de Cão Negro! Um personagem tão rico merece umas boas
500 páginas de Romance!
MORDRED
Um conto tenso, crucial, sobre
uma das várias versões da história de Rei Arthur.
Os nomes não são citados, mas
esse Mordred é o da versão em que Arthur e Morgana são irmãos e concebem
Mordred, a última esperança de Avalon, durante o Beltane.
Neste conto denso, pai e filho se combatem até a morte:
Arthur defendendo a maldição católica e Mordred as tradições antigas do povo da
terra.
“Nem sempre quem está do lado
da razão consegue vencer. O mundo está tomando um rumo que ele mesmo escolheu.”– São as sábias palavras finais de [Morgana] para o
filho que atravessava o Véu.
E o mundo escolheu a dor e o
sofrimento, não é?
UMA SEPULTURA SOBRE A COLINA
Mais um conto do guerreiro
mercenário Anrath.
Nesta aventura, o mercenário
presenciará a Batalha de Tara, ocorrida há 40 anos na Colina de Tara,
lendariamente mais grandiosa que a batalha em que ele lutou e ganhou a alcunha
de “Cão Negro”.
É 31 de outubro, a primeira noite
de Samhain, e durante sua viagem para se juntar ao exército de Vlaid,
ele salva da morte imediata Fearghal, se ser estraçalhado e devorados
pelos lobos. O velho é o último guerreiro vivo que lutou na Batalha de Tara, e
queria reviver o seu momento de glória antes de morrer.
Diante de um cenário onírico,
ambos guerreiros presenciam, por instantes, o espectro da grande batalha
ocorrida há décadas. Mesmo depois de tanto tempo, o espírito daquela batalha
continuava vivo no Outro Mundo, podendo ser vislumbrada apenas na
primeira noite de Samhain.
O RELATO DO CAPITÃO BLACKBURN
Um conto diferente sobre vampiros.
Blackburn é um Homem do
Mar, capitão do navio Lemora e um personagem que me passa a mesma
impressão ondulante e melancólica do “Povo D’água”.
Este conto é uma missiva que
Blackburn escreve ao Inspetor Constantino, relatando uma de suas
expedições mercenárias em que havia embarcado uma bizarra encomenda, que
deveria ser entregue e enterrada na distante terra da América do Sul.
Um conto sobre vampiros, mas
sobre os bons e velhos vampiros, que causa pavor mas também piedade
por tão desgraçada criatura.
A MÚSICA DO QUARTO AO LADO
Ah, esse é um conto tão
bonitinho, mas com um macabro final...
Um jovem músico; Jazz; um
encontro ocorrido por afinidades musicais peculiares; uma reação química
perfeita e... um final inesperado!
É isso que dá ter expectativas
sobre um conto romântico escrito por um homem: alguém sempre tem que
morrer no final :/
O FILME
César Alcázar reuniu sua
outra paixão neste conto: os filmes B. E contou a sua versão para a
morte do diretor Guerrieri e o desaparecimento de seu último filme que
jamais foi exibido.
O filme em questão, cujo titulo
não foi revelado, produzia um fascínio obsessor àquele que o assistisse,
horrorizando o Crítico que fora o primeiro a assistir à película fora do
meio de produção. Havia algo diabólico que prendeu a atenção do homem, chegando
a perturbar sua mente!
Há pontos muito interessantes
nesse conto: o filme “sem título”; o enredo do filme que não é descrito, apenas
mostrado o resultado obsedante dele; o Crítico, que também não é nomeado em
nenhum momento, mas que leva o leitor a pensar que seja ele o assassino de
Guerrieri e que roubou a, aparente, única cópia do filme, criando aí uma
situação mítica para um caso que nunca foi solucionado.
Simples, mas bem sacado :)
A ÚLTIMA VIAGEM DO LEMORA
Último conto de Bazar Pulp,
mais um conto do ambicioso Capitão Richard Blackburn, narrando por ele
mesmo.
Essa história se passa durante a Primeira
Guerra Mundial, em que o navio Lemora – e toda a tripulação –
encontra o seu fim.
Apesar dos receios em navegar
pelas águas tomadas por cruzadores e submarinos alemães, o dinheiro bem pago
convenceu Blackburn em alistar o seu navio para levar suprimentos aos aliados.
Apesar do Capitão e sua
tripulação terem sobrevivido ao enfrentamento de um submarino alemão, chamado
por eles de U-boat, não foi isso que causou a ruína do Lemora e
Blackburn. Mais uma vez a ambição do Homem do Mar dominou a sua razão e ele
levou para dentro do navio um ídolo maldito esculpido em pedra, que encontrou
numa sinistra ilha, que mais parecia um cemitério de navios, em que eles
aportaram para consertar os danos causados pelos alemães. A bizarra figura
levou Blackburn a tal fascínio que ele carregou aquela coisa, levando a
desgraça para o Lemora e seus tripulantes.
A Justiça Poética do Destino
Irônico fez com que Blackburn fosse o único sobrevivente daquela aterrorizante
tragédia que ele próprio, com a sua ambição desmedida, provocou, obrigando-o a
sobreviver com as lembranças e a culpa.
Achismo Final:
Em todos os contos, sempre paira
um sentimento melancólico e desgraçado, pois, me parece, são histórias contadas
por aqueles que faliram e fracassaram, o que é bem legal, pois os perdedores
sobreviveram para contar suas histórias: sem falsos heroísmos, sem glórias, sem
adulações.
Bazar Pulp cumpriu sua missão ;]
2 comentários:
Ao meu xará e colega da pena, parabens pelo criativo trabalho. Pat, sou fã das tuas resenhas.
Só tu mesmo, Cesar!
Num ti dissi que tua terra tá cheia de bons escritores?
Obrigada pela preferência ^^
Bjin!
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